segunda-feira, 26 de maio de 2008

Da Sacada

Sento-me na sacada como quem não quer nada, inocente. Entre o gole e a tragada olho p’ro céu e nada. Nenhuma estrela presente. Apenas um tico de lua crescente, dependurada como uma unha polida, branca, bem cuidada, a ponta do dedo de Deus a apontar o poente. E aponta, insistente, o dedo que indica o caminho do horizonte.

Logo se esconderá atrás dessas estruturas, dos prédios, das coisas duras que nos proíbem espaço.

Das ruas, não vejo nada. Só lá adiante uma nesga advinha o cruzamento com todo o seu movimento. De resto tudo parece uma calma imaginada. Qual nada! A cidade não relaxa! A gente que, vendo pouco, acha que o momento é de repouso. Não ouso me enganar dessa forma.

Sei que a regra, a norma, é estar obscurecido nesse momento dividido. A cidade pulsa, eu não. E assim, sexto andar, penso meu solo sereno, tão remédio quanto veneno, como o fará a dose.

O vento fresco me espanta. Saio da sacada, recolho o copo e o cinzeiro, trago p’ra dentro de casa os olhos que guardam um horizonte normal, memorado, um espectro melhorado do que vi, do que lembrei, do que pensei, no instante efêmero.

Coisas desse gênero me fazem feliz, eu sei.

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